Todos nós já ouvimos a expressão “problemas de primeiro mundo”, irmão mais velho do “classe média sofre”. É um meme do Twitter, uma alfinetada desdenhosa dirigida a quem fica decepcionado porque seu moccachino não tinha era espuma o suficiente (ou qualquer outra coisa do gênero, que certamente não é um problema de verdade em face a outros muito piores). E embora os países mais avançados de fato tenham “problemas” que fariam as outras nações chorarem de inveja, existem algumas áreas onde até mesmo os ricos poderiam usar uma mão amiga. Confira:
10. A Rússia é um paraíso de senhores de escravos
A escravidão é uma daquelas coisas que nós associamos com o passado distante e com os países mais pobres e à margem da civilização. Sabemos que é ruim e nós somos instintivamente contra, mas não poderia acontecer em qualquer nação moderna, rica, certo?
Tente dizer isso para a Rússia. Em um relatório recente, o Departamento de Estado dos EUA classificou o país como um dos piores para a escravidão em todo o mundo. De acordo com o grupo de defesa da Humanity United, existem atualmente cerca de um milhão de russos sendo mantidos em condições de trabalho forçado, incluindo cerca de 50 mil crianças que trabalham involuntariamente como prostitutas. E isso é antes de começarmos a falar sobre o abuso de trabalhadores migrantes.
Em seu relatório, o Departamento de Estado revelou que os estádios dos Jogos Olímpicos de Inverno de 2014 estão sendo construídos nas costas do que vamos chamar não eufemisticamente de “trabalho escravo”. Os trabalhadores têm seus passaportes confiscados, são forçados a trabalhar 12 horas por dia, com apenas um dia de folga por mês. Por vezes, são alojadas até 200 pessoas em uma única casa de quatro quartos. No entanto, as autoridades não fazem quase nada para coibir este abuso, e prisões são extremamente raras. Então, sim, se você sonha em ser um novo Martim Afonso de Sousa, pode arrumar as malas e partir para a Rússia.
9. A Grécia é mais corrupta do que ditaduras
Provavelmente não é surpreendente saber que a Grécia é um pouco propensa à corrupção. Afinal de contas, o sul da Europa é quase famoso por seu suborno amigável e leve aroma de escândalos sexuais – nem todos os lugares podem ser Escandinávia, certo? Mas a corrupção grega vai além da mera pose e chega mais perto de um “Estado falido”.
Quando a organização Transparency International lançou seu Índice de Corrupção de 2012, a Grécia foi classificada como o 94º país mais corrupto na Terra (de menos a mais corrupto, iniciando com o oásis da honestidade, Noruega, e terminando com o que parece ser uma causa perdida, a Somália). Evidentemente que ainda está anos-luz à frente de, por exemplo, Afeganistão ou Coreia do Norte, mas fica na frente de Arábia Saudita, Jordânia, Omã, Qatar e Cuba.
No caso de você não estar em dia com as aulas de geografia, isso significa que esta nação membro da União Europeia é oficialmente mais corrupta do que várias ditaduras. Não só isso, também é mais corrupta do que vários países do terceiro mundo (como Libéria, Suazilândia e Benin), onde quase toda a população vive abaixo da linha da pobreza e ainda têm coisas como monarcas absolutistas. O único conforto que os gregos podem tirar de tudo isso é que eles ainda se saíram melhor do que a Rússia, que emplacou um terrível 133º lugar. Caso esteja se perguntando, o Brasil está em 69º lugar, incrivelmente melhor do que a Grécia (embora nossos políticos possam ter conseguido corromper o índice).
8. Israel falha na liberdade de imprensa
Na maioria das áreas, Israel cumpre os critérios de funcionamento de uma democracia moderna. No entanto, segundo a organização Repórteres Sem Fronteiras, o compromisso com a abertura e a transparência não se estende à liberdade de imprensa. Simplificando, Israel tem alguns dos jornalistas mais censurados do mundo.
Em seus rankings mundiais de 2013, o grupo colocou Israel em 112º: atrás de países como Guiné-Bissau, que opera a censura militar sobre os meios de comunicação; as Maldivas, onde os jornalistas foram atacados pelas forças governamentais; e Mali, onde os militares derrubaram a emissora do Estado e arbitrariamente torturaram jornalistas. Mesmo a Guatemala, castigada pela guerra às drogas, se saiu melhor, ficando em 95º, apesar dos assassinatos frequentes que afligem a imprensa que lá trabalha. Em outras palavras, apesar da competição dura, Israel conseguiu pisar na liberdade de imprensa a um grau que mesmo grupos militares empobrecidos só poderiam sonhar.
7. O Brasil tem quase 3 milhões de jovens trabalhando de forma irregular
A organização Free The Children, do Canadá, luta para libertar crianças de todo o mundo de todos os tipos de violência. Uma de suas principais metas é ajudar a acabar com o trabalho infantil, que mantém milhões de garotos e garotas longe das escolas. Ainda que seja proibido por lei no Brasil – onde só pode trabalhar quem tem mais de 14 anos, e mesmo assim, na condição de aprendiz e por poucas horas diárias -, um relatório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) revelou que há quase 3 milhões de jovens trabalhando em situação irregular por aqui.
Ainda mais chocante é a revelação que muitos deles são submetidos a um regime de escravidão ou trabalham para pagar dívidas assumidas pelos pais. O governo só começou a cuidar do problema no início da década de 1990, a partir de quando os índices começaram a cair. Além da criação do Estatuto da Criança e do Adolescente, políticas públicas como a criação do Programa de Erradicação do Trabalho Infantil, de 1996, Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef), de 1998, o Bolsa Escola, de 2001, e o Bolsa Família, de 2005, também contribuíram para a diminuição destes números.
Mesmo que estas ações sejam menos eficientes no caso de crianças maiores de 10 anos, a boa notícia é que, ao menos entre as crianças de 5 a 9 anos, o trabalho pode ser erradicado ainda nesta década. O mínimo para um país que caminha para o pleno desenvolvimento e possui a maior economia da América Latina e a sétima maior do mundo.
6. Glasgow tem uma expectativa de vida menor do que algumas zonas de guerra
Graças a décadas de crescimento econômico desenfreado, os avanços da medicina e a melhoria da igualdade, a expectativa de vida cresceu no Ocidente. Se você é homem e mora no Reino Unido, por exemplo, você pode esperar viver bons 78,5 anos, em comparação com os 56 que etíope pode obter. Exceto, é claro, que viva no leste de Glasgow, onde você pode se considerar com sorte se chegar perto dos 54.
Não é brincadeira. O bairro de Calton Glasgow tem uma das mais baixas expectativas de vida para os homens. E não apenas entre os países desenvolvidos, mas em todo o mundo. Pessoas de lá vivem com uma pobreza esmagadora, com algumas das mais altas taxas de vício em álcool e drogas e falta de moradia do mundo ocidental. A expectativa média de vida dos homens é 53,9 anos, menor do que o Afeganistão (59), Costa do Marfim (55), Haiti (61) ou até do Iraque (65). Mesmo crianças do sexo masculino nascidas no pesadelo da Somália só vão viver uma média de 4 anos a menos do que os seus homólogos glasgowianos – e estas são crianças que podem esperar passar as suas vidas sendo bombardeadas, baleadas e quase explodidas.
A área é tão bagunçada que os jovens de países em desenvolvimento como a Indonésia fazem trabalhos voluntários por lá, na esperança de fazer uma diferença significativa. Em suma, este cantinho do super-próspero Reino Unido pode reclamar o título de um dos com mais privações do mundo.
5. A inacreditável taxa de suicídio da Coreia do Sul
É bastante óbvio que a pobreza causa a depressão. Se você não concordar, fique à vontade para jogar fora seus pertences e tentar viver nas ruas por um ano, que nós iremos esperar pelo seu relatório. Sendo assim, podíamos esperar que os que vivem em extrema pobreza nas nações em desenvolvimento seriam mais propensos ao suicídio do que os ocidentais ricos. Mas esse não é o caso. Na verdade, existem alguns países mais ricos onde o suicídio parece ser quase endêmico.
Tome o Japão como exemplo: o país é uma das sociedades mais ricas e igualitárias do planeta, mas tem uma taxa de suicídio superior a Zimbábue, Venezuela, Nicarágua, Haiti, Jamaica e Guatemala somados. E nem mesmo isso chega perto da Coreia do Sul. A cada 100 mil homens sul-coreanos, 40 tiram a própria vida. Isso coloca a nação entre as maiores taxas de suicídio na Terra, comparável a países como Cazaquistão, Ucrânia e Sri Lanka. Na verdade, apenas a Hungria e a Rússia são ambos igualmente ricos e mais propensos ao suicídio, mas, mesmo assim, o PIB da Hungria é uma fração da Coreia do Sul. É a prova final, caso ainda seja necessário, que o dinheiro definitivamente não pode comprar felicidade.
4. As leis bárbaras de aborto da Irlanda
O que Haiti, Iêmen, Sudão, Somália, Irã, Afeganistão e Irlanda têm em comum? A resposta é que, até apenas uns dois meses atrás, todos eles proibiam completamente o aborto, mesmo quando a vida da mulher estava em jogo.
Em 2012, uma mulher indiana grávida vivendo na Irlanda sofreu complicações e corria risco de morte. Levada às pressas para um hospital, ela foi informada de que não havia chance de o bebê sobreviver. Havia também muito poucas chances de ela sobreviver, a menos que os médicos forçassem o término da gravidez. Eles se recusaram. À época, o aborto ainda era tão ilegal na Irlanda que não poderia ser feito mesmo para salvar a vida da mãe, ainda que existisse a garantia de que o bebê morreria de qualquer jeito.
Na sequência da sua morte, a Irlanda finalmente empurrou um projeto de lei que permitiria a finalização forçada da gestação, porém apenas se a vida da mãe estivesse em risco. Ainda assim, a Irlanda fica largamente atrás de todos os outros países desenvolvidos na questão do direito ao aborto. Mesmo Argélia e Paquistão permitem a prática para salvar a mãe de doenças ou acidentes, assim como a Etiópia, Costa Rica e Zimbábue. Para colocar a situação em perspectiva, esta é uma área onde até mesmo a Coreia do Norte supera a Irlanda – algo que nunca deve ser motivo de orgulho.
3. Os Estados Unidos têm uma horrenda taxa de homicídios por arma de fogo
Sem entrar na política de controle de armas, todos podemos provavelmente concordar que os EUA têm sua cota de tiroteios. Mas se fosse para classificá-lo em homicídios causados por arma de fogo em relação ao resto do mundo, em que lugar você acha que ele ficaria? Perto de outros países ocidentais, talvez?
Tente bem perto da “lanterninha”. Com uma taxa de homicídios por arma de fogo de 2,97 para cada 100 mil pessoas, nenhuma outra nação desenvolvida se aproxima dos norte-americanos. O único outro estado ocidental que está um pouco próximo é o minúsculo principado europeu de Liechtenstein, com um índice de 2,95. Porém, para a pequena população de Lichtenstein, de pouco mais de 34,5 mil habitantes, isso significa algo como um único tiro por ano. O mais próximo depois disso é a Suíça, com 0,77, ou seja, quase um quarto dos Estados Unidos.
Isso significa que nos EUA a taxa de homicídios por arma de fogo é pior do que na Cisjordânia e em Gaza, pior do que em Uganda ou no Camboja, até mesmo pior do que a caótica República Democrática do Congo. É somente graças aos cartéis de drogas da América Latina e da violência endêmica da África do Sul e Jamaica que os EUA não estão ainda mais para baixo na lista.
2. O Reino Unido é uma sociedade de vigilância endêmica
Pode não ser um problema do terceiro mundo, estritamente falando, mas nós tendemos a associar vigilância endêmica do estado com nações em desenvolvimento governadas por ditadores.
Bem, você pode querer reconsiderar. Alguns anos atrás, a organização Privacy International realizou uma pesquisa global sobre a vigilância do governo e classificou cada país de acordo com esse critério. Eles levaram em conta coisas como a prevalência da emissora CCTV, o monitoramento das fronteiras e liberdades na internet, e chegaram à conclusão de que o Reino Unido é um dos piores estados “espiões” do mundo. Apenas os EUA, China e Rússia se saíram igualmente mal, mesmo com regimes semi-autoritários e estados corruptos fazendo visivelmente melhor.
Mas isso foi há muitos anos, e os EUA se saíram igualmente mal, então porque é que este tópico é especificamente sobre o Reino Unido? Bem, vamos dar uma olhada no recente escândalo da NSA. Nos Estados Unidos, o escândalo foi seguido por um debate aberto e o congresso nacional exigiu explicações de Obama por suas tendências ditatoriais. Quer tenha tido bons resultados ou não, a cobrança pelo menos foi feita.
No Reino Unido, o jornal que divulgou a história está sendo investigado pela legislação antiterrorismo. Antes disso, agentes do governo apareceram na sede do jornal e esmagaram seus computadores portáteis com martelos, alegando que eles tinham informações delicadas. Também prenderam o marido da jornalista que escreveu a matéria. Por fim, o resto da mídia foi oficialmente avisada para não informar sobre os vazamentos, a fim de não fazer “divulgação inadvertida de informações que possam comprometer o exército do Reino Unido e operações de inteligência”. Estamos começando a achar que o governo do Reino Unido equivocadamente arquivou “1984″ de George Orwell como “boas ideias”.
1. Os problemas de Israel com os direitos humanos
No início deste ano, a Relief Web – parte do Gabinete das Nações Unidas para Assuntos Humanitários – lançou seu Índice Anual de Risco de Direitos Humanos. O índice faz exatamente o que o nome sugere: classifica os países de acordo com o risco que representam para os direitos humanos. O objetivo é destacar os países com um “extremo” risco como Irã, Iraque, Sudão ou Somália, mas também ressalta aqueles onde os direitos humanos sofrem “alto risco”, países como Argélia, Malásia, Cazaquistão, Cuba, Turcomenistão… e Israel.
De acordo com o relatório, a democracia mais desenvolvida do Oriente Médio tem um problema de direitos humanos comparável ao de países que mal saíram da Idade das Trevas. A nação ficou com uma classificação inferior a qualquer outra do primeiro mundo, com apenas a Rússia fazendo mais para sistematicamente esmagar toda a dignidade humana. Na verdade, os únicos países europeus a chegar perto (sendo Israel um “estado associado” da União Europeia) foram Ucrânia e Bielorrússia, uma ditadura arcaica ao estilo soviético, onde dissidentes políticos são frequentemente torturados. Reforçando: isso é de acordo com um órgão das Nações Unidas, especificamente criado para monitorar os abusos dos direitos humanos. Parece que o desenvolvimento econômico e o respeito pelos direitos humanos nem sempre andam de mãos dadas. [
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